«Descartáveis
Mário Contumélias, Docente universitário
Eles e elas estão aí e são cada vez em maior número. Constituem a nova classe de trabalhadores, criada pela economia capitalista. Depois dos "proletários" das fábricas, eis agora os "precários", do comércio e dos serviços. Para mal da sua ausência de pecado, não passam de trabalhadores "descartáveis", tipo usar e deitar fora, com baixos salários, sujeitos a grande rotatividade e total insegurança, impedidos de se projectarem no futuro.
São os filhos bastardos no neoliberalismo, o produto perverso da flexisegurança. Configuram uma nova forma de exclusão de uma vida plena que nos é apresentada como uma inevitabilidade do mundo moderno, como se, por detrás da sua existência, não estivessem decisões propriamente políticas e económicas.
Uns são mais jovens, outros mais velhos. Muitos têm formação académica, mas são forçados a escondê-la para conseguirem um posto de trabalho numa caixa de hipermercado, ou agarrados ao telefone de um qualquer call-center. São empregados intermitentes, contratados a prazo com salários insuficientes, estagiários sem remuneração. E, para agravar a situação, são todos igualmente órfãos do finado Estado social.
Mas os trabalhadores "precários" não são um facto exclusivamente português, antes constituem um fenómeno transversal às sociedades da dita modernidade globalizada. E têm consciência, de um modo crescente, da sua dramática condição social. Por isso, constituíram um movimento que atravessa a União Económica Europeia, e que se iniciou em Milão, no ano de 2001.
Esse movimento dá pelo nome de "Mayday", palavra que envolve, ao mesmo tempo, dois significados simbólicos. Por um lado, trata-se de uma palavra-código, internacionalmente usada como pedido de socorro, em caso de perigo extremo. Por outro, refere-se ao dia 1 de Maio, em que, por esse mundo fora, os trabalhadores celebram as conquistas de direitos universais, hoje em declínio acentuado.
Por toda a Europa, "Mayday" é assinalado com uma parada de "precários", iniciativa que chegou a Lisboa no ano passado. Este ano, em Portugal, o movimento fez já assembleias, acções públicas, festas. No próximo primeiro de Maio, aderentes e simpatizantes do "Mayday", juntar-se-ão, na rua, "contra a exploração" e "o emagrecimento dos apoios sociais e à habitação", assim "continuando o percurso de mobilização e visibilidade".
Os "precários" portugueses, tal como os de outros países, sentem-se "empurrados para o conformismo e para a resignação", mas nem por isso deixam de resistir à "desigual condição" em que vivem. E dizem, com razão, que "não tem de ser assim".
Num mundo marcado por um capitalismo desregrado e selvagem, num país pretensamente governado à esquerda, junto a minha voz à deles "Mayday! Mayday! Mayday!".
"Precários" somos todos nós, os nossos filhos, os nossos netos. A precariedade em que vivemos não é um desígnio de Deus, nem um cataclismo natural. É, apenas e só, um dos mais abjectos vómitos da iniquidade social que desumaniza o mundo em que vivemos. E chegou a altura de dizer basta!»
Mário Contumélias, Docente universitário
Eles e elas estão aí e são cada vez em maior número. Constituem a nova classe de trabalhadores, criada pela economia capitalista. Depois dos "proletários" das fábricas, eis agora os "precários", do comércio e dos serviços. Para mal da sua ausência de pecado, não passam de trabalhadores "descartáveis", tipo usar e deitar fora, com baixos salários, sujeitos a grande rotatividade e total insegurança, impedidos de se projectarem no futuro.
São os filhos bastardos no neoliberalismo, o produto perverso da flexisegurança. Configuram uma nova forma de exclusão de uma vida plena que nos é apresentada como uma inevitabilidade do mundo moderno, como se, por detrás da sua existência, não estivessem decisões propriamente políticas e económicas.
Uns são mais jovens, outros mais velhos. Muitos têm formação académica, mas são forçados a escondê-la para conseguirem um posto de trabalho numa caixa de hipermercado, ou agarrados ao telefone de um qualquer call-center. São empregados intermitentes, contratados a prazo com salários insuficientes, estagiários sem remuneração. E, para agravar a situação, são todos igualmente órfãos do finado Estado social.
Mas os trabalhadores "precários" não são um facto exclusivamente português, antes constituem um fenómeno transversal às sociedades da dita modernidade globalizada. E têm consciência, de um modo crescente, da sua dramática condição social. Por isso, constituíram um movimento que atravessa a União Económica Europeia, e que se iniciou em Milão, no ano de 2001.
Esse movimento dá pelo nome de "Mayday", palavra que envolve, ao mesmo tempo, dois significados simbólicos. Por um lado, trata-se de uma palavra-código, internacionalmente usada como pedido de socorro, em caso de perigo extremo. Por outro, refere-se ao dia 1 de Maio, em que, por esse mundo fora, os trabalhadores celebram as conquistas de direitos universais, hoje em declínio acentuado.
Por toda a Europa, "Mayday" é assinalado com uma parada de "precários", iniciativa que chegou a Lisboa no ano passado. Este ano, em Portugal, o movimento fez já assembleias, acções públicas, festas. No próximo primeiro de Maio, aderentes e simpatizantes do "Mayday", juntar-se-ão, na rua, "contra a exploração" e "o emagrecimento dos apoios sociais e à habitação", assim "continuando o percurso de mobilização e visibilidade".
Os "precários" portugueses, tal como os de outros países, sentem-se "empurrados para o conformismo e para a resignação", mas nem por isso deixam de resistir à "desigual condição" em que vivem. E dizem, com razão, que "não tem de ser assim".
Num mundo marcado por um capitalismo desregrado e selvagem, num país pretensamente governado à esquerda, junto a minha voz à deles "Mayday! Mayday! Mayday!".
"Precários" somos todos nós, os nossos filhos, os nossos netos. A precariedade em que vivemos não é um desígnio de Deus, nem um cataclismo natural. É, apenas e só, um dos mais abjectos vómitos da iniquidade social que desumaniza o mundo em que vivemos. E chegou a altura de dizer basta!»
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