segunda-feira, abril 28, 2008

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Miguel Portas in Sol de esquerda

«Facto. Motins no Haiti e no Senegal ou em Marrocos e no Egipto, porque está a crescer o número dos esfomeados que não se resignam à penúria de pão.
Facto. Em 2007, os preços dos cereais aumentaram 120 por cento. Não falta apenas pão em vários lugares do planeta. Falta algibeira para chegar aos alimentos básicos disponíveis.
Facto. O Banco Mundial, acossado de compaixão, anuncia que 100 milhões de pessoas poderão morrer de fome, se não se puser um travão à subida dos preços.
Pergunta. Por que sobem eles? Motivos próximos misturam-se com causas antigas. O modo como cada factor se repercute nos preços finais, é mal conhecido. Sabe-se, por exemplo, que em 2007 a produção mundial de alimentos caiu. Em parte, porque o tempo está a enlouquecer e em parte porque as áreas cultiváveis continuam a diminuir.
Sabemos porque é que o tempo está a enlouquecer. Os tsunamis e as secas não são, como as sete pragas do Egipto, uma zanga do Altíssimo. São consequência de não sabermos cuidar do que é de todos.
Por outro lado, o recuo das áreas cultiváveis envergonha os que agora clamam «aqui vai el-rei». Durante décadas, o Banco Mundial e o FMI andaram a dizer ao mundo que a agricultura de subsistência era coisa do passado, que os Estados deviam desinvestir nos melhoramentos de proximidade e apoiar as culturas de exportação. Por estas e outras, a Índia é, hoje, um importador líquido de cereais. E em África a mandioca, o sorgo ou o milho, culturas tradicionais, foram substituídas pela carcaça. Chegou a hora da factura.
Nesta equação, discutem-se os agrocombustíveis. Há pouco menos de um ano, José Sócrates e Durão Barroso cantaram hossanas ao milagre que iria pôr fim à dependência do petróleo. A Europa decretou que eles deveriam pesar 10 por cento no mix energético de 2020. Fidel Castro contestou violentamente, mas em Bruxelas ninguém ligou, porque era velho e ditador. Agora, são a Agência Europeia de Ambiente e o próprio Banco Mundial que repetem os argumentos do jarreta.
Não se sabe quanto pesam os biocombustíveis na actual alta dos preços. A sua produção não representa mais do que 2 por cento do total da matéria vegetal com origem na agricultura. Mas a verdade é que tem substituído produções tradicionais, tem feito crescer a desflorestação e está a alinhar os preços dos cereais pelos da energia.
Os camponeses trocavam bem esta moda pelo apoio à agricultura familiar, por microcrédito, refrigeradores, melhorias na irrigação e caminhos. Mas não é tudo. O pior das proclamações de Bruxelas é que orientam as aplicações de capital para as bolsas de cereais, hoje autênticas roletas de casino. Eis no que dá a esperteza saloia de dois portugueses com a mania que são modernaços.»

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