sexta-feira, agosto 08, 2008

Realolympic

Às 8 horas e 8 minutos do dia 8 do oitavo mês do ano de 2008, ocorreu a cerimónia de abertura dos XXIX Jogos Olímpicos. Independentemente da grandiosidade ou não da cerimónia, do maior ou menor número de medalhados, de ocorrerem ou não atentados terroristas, estes Jogos Olímpicos ficarão para a história como o momento em que o mundo se deixou prostituir a troco de um punhado de dólares.
A poucos meses da cerimónia de abertura, durante o percurso da chama olímpica, teve-se a primeira demonstração pública e mediática do que é o sistema político da China. Por essa altura, uma violenta repressão ocorreu no Tibete, não antes de todos os repórteres e estrangeiros terem sido expulsos do país ocupado. De repente, descobriu-se que a China bloqueia o acesso a determinados sítios da internet restringindo a liberdade de expressão. De repente, a comunicação social lembrou-se que a República Popular da China é uma ditadura; que não respeita os direitos humanos; que invadiu e permanece ocupante do Tibete; que vende armas aos mais criminosos regimes deste mundo; que usa a sua posição como membro permanente do conselho de segurança da ONU para proteger governos hediondos; etc.
Mas a China é muito mais do que isto. A china é o terceiro maior país do mundo, o mais populoso, uma superpotência militar e política e a quarta maior economia do planeta. Por tudo isto, e muito mais, recorre-se à Realpolitik e ignora-se tudo o resto. Assim o fez José Sócrates ao apertar a mão a Kadafi, ao elogiar o “trabalho notável” do governo de Angola, ou ao trocar umas palmadinhas nas costas com Hugo Chávez. Perante a possibilidade de um negócio chorudo interessará tudo o resto? O Comité Olímpico Internacional e as grandes potências mundiais, acham que não. Vejam-se os líderes mundiais presentes na cerimónia de abertura.
O nível de cegueira auto-induzida é tanta que, há cerca de uma Semana, o COI emitiu um comunicado em que pedia desculpa à comunicação social estrangeira em Perquim. Por haver censura na China? Não! Pediam desculpa porque poderiam ter induzido em erro, ao longo destes meses, aqueles que acreditavam que a China seria mais tolerante durante o período dos JO.
Fascina-me o argumento de que os Jogos Olímpicos são um evento desportivo e não se deverão imiscuir com a política. Mas há algum assunto da nossa vida em que a política não tenha nada a ver? E os Jogos Olímpicos de Berlim, Melbourne, Munique, Moscovo, Los Angeles, ou a resolução 1761 da Assembleia-Geral da ONU? Não foram tudo motivos políticos?
Não defendo um boicote aos JO de Pequim. Tal como não defendo um corte de relações diplomáticas com a China, nem um bloqueio à importação de produtos chineses. Defendo sim, que não se esqueça o que a China é, e o que pode vir a ser. Defendo que não se troquem direitos humanos por dinheiro, nem que se seja hipócrita por uns dias, só porque convém. Sejamos sérios.
A China é demasiado importante para se ofender, mas demasiado suja para se beijar. Assim, estende-se a mão e finge-se não olhar para a sujidade. Cumprimenta-se e saúda-se o anfitrião mas sem se curvar muito. Ignora-se tudo o resto se houver a possibilidade de um bom negócio. Se pensarmos bem, é mais ou menos assim que funciona a prostituição.

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